VIVENDO  E SE ENAMORANDO PELO APLICATIVO

30/12/2019
Como entender esse tempo, em que a busca pela amizade se transformou num algorritmo que leva todos a se confrontar com o amor e a sexualidade?

Eram 9 horas da manhã e Bob Devasso ainda estava na cama.

Fazia uns 30 minutos que tinha acordado, dado uma breve levantada para ir ao banheiro fazer um xixi, passar na cozinha para beber seu suco de uva, que ele achava fazer bem a saúde por conter vitamina B, e tomar seu remédio, como fazia diariamente desde que descobriu ser hipertenso.

Como era domingo, voltou para a cama.

Em dias normais era a hora do Bob abrir o celular para começar sua rotina de informação, ler as notícias do que tinha acontecido, e do que poderia acontecer no Brasil e no mundo.

Seu interesse particular recaia sobre o noticiário político e econômico, já que em função de ter de esticar os poucos caraminguás que seus sete casamentos lhe deixaram, tinha de estar ligado em riscos e fatos relevantes que poderiam vir a influenciar os papéis na Bolsa.

Gostava de estar ali, sem fazer nada, coçando o saco, alimentando a preguiça, e essa modorra costumava lhe trazer alguma inspiração para postar algum conteúdo nas páginas e redes sociais que mantinha pela internet, pois tinha a pretensao de escrever um livro de memórias com suas sordidas estórias, e precisava se exercitar pra melhorar o texto fraquinho.

Nessa lenga lenga do que fazer naquele domingo, veio a lembrança do dia anterior.

Meio avesso a relacionamentos virtuais, Bob Devasso vivia quieto no seu canto, numa reclusão desassistida, após o fim de uma relação de quase 30 anos com Andrea, uma pernambucana gostosa, bundinha empinada, que havia conhecido num dos seus trabalhos como escritor, tempo em que se dedicava a viver como um palhaço contador de estórias.

Sim, por que Bob Devasso já fez de tudo na vida, e ao mesmo tempo que adquiria a fama de galinha mulherengo, ralava que nem um louco pra pagar suas pensões.  

Do fim da última relação já haviam se passado 3 anos, quando lhe apareceu Luzinete, que como quem não quer nada, curtia e comentava em suas bobagens pela rede, vestida em uma figura séria nas fotos que postava, mulher de modos que era da distante Florianópolis, mas que há uns dias atrás tinha resolvido se apresentar numa conversa mais informal, cheia de nove horas e sacanagens, pelo Whatsapp.

Papo vai, papo vem tiveram a ideia de conversar diretamente, ao invés de ficar trocando mensagens de texto e de voz pelo aplicativo. E se havia uma coisa que animava o Bob Devasso era um bom papo repleto de putarias, conversa regada a palavrões e sexo, mesmo que virual.

Para ele aquela trolagem seria a grande novidade do fim ano, trocando uma ideia com uma mulher que lhe deixasse de pau duro, dotada de sensualidade e desejo, uma mulher diferente da dona de casa cheia de moral que lhe acompanhara até tempos atrás, conversa que pudesse passar rapidamente para um gozo gostoso.

Entretanto, naquele fim de ano ainda não estava preparado, tinha se decidido a passar só, ouvindo musica e maratonando em estorias agua com açúcar pela internet.

Bob Devasso não  era propriamente aquilo que se podia chamar de um solitário. Em seu retiro recebia de vez em quando  a visita das putinhas da vizinhança, em busca de algum presente em troca de lhe fazer um boquete. Era assim que mantinha sua forma sexual, com punhetas e boquetes das pretinhas e branquelas da vizinhança.

Já na internet, onde Luzinete o conheceu,  se exibia como um solteirão frajola, mais por vaidade do que por vontade de voltar a ter um relacionamento sério com alguém. Mulher pra um relacionamento continuava a ser as de outrora, quando fazia sucesso no mundo cultural, e era capaz de exercitar a libido em qualquer lugar que lhe inspira-se uma trepada.

Por isso tinha se transformado num Bob Devasso diferente do que fora antes, um puto sem sentimentos, exímio punheteiro vivendo as custas das mãos e bocas de mulherzinhas safadas, que lhe traziam inspiração bastante para ficar de pau duro e lhe bater uma bronha, sem precisar ficar acessando sites pornô.

A conversa com Luzinete tinha sido divertida, lembrando os papos que mantinha com as moças liberadas dos tempos da faculdade. Extremamente comunicativa, contou da sua vida, suas desilusões, seus casamentos, suas paixões, e abordaram decepções comuns, como as do Tinder, site de relacionamentos que ele não conseguiu permanecer por mais de 24 horas.

Rira bastante, se divertira, mas também foi chato. Não aguentou aquele chororô repetitivo de mulher abandonada pelo marido, e de ouvinte passivo começou a cagar regras con a moça que, pelo visto só estava a fim de se divertir numa boa transa, embora no fundo falasse das expectativas de conquistar um novo amor.

A moça se foi, e depois de mais de 2 horas de conversa, desligaram o telefone do aplicativo, ficando a impressão de que já estavam namorando, embora não tivessem partido pras vias de fato do sexo virtual.

Passaram-se algumas horas para que ele se de-se conta da situação, e caisse na real.

Não sabia direito como atender a expectativa de voltar a viver um estilo de vida que nada tinha ver com a vida que vivia agora.

Tinha se tornado um homem acostumado a não ter de dar satisfação a ninguém, passando horas navegando pela internet, visitando realidades diferentes da sua, curtindo, comentando, escrevendo seus artigos sobre política, comportamento, mercado de ações ao som do jazz, a música que conseguia elevar seu espírito e fazer a conexão com Deus e, nas horas vagas, se divertia fazendo um sexo ocasional seguro, sem penetração.

Como iria voltar a viver em sociedade, da mesma forma que viveu seus melhores tempos de vida burguesa, se tinha se tornado um sacana de vida simples, minimalista como sempre quis ser fazendo jus de verdade ao apelido que a vida lhe deu, Bob Devasso?

Porque namorar alguém, mesmo que pela internet é um gesto social de afetividade, que resulta encontrar pessoas e compartilhar momentos e situações. Não é como ir a casa de uma amigo ou amiga, ou se reunir com a família. Trás novidade, te põe de frente ao gesto de se apaixonar e se envolver. Já com as vadias que recebia em sua alcova não tinha esse risco, tudo era mulher vulgar que nem sabia conversar direito.

Além disso tinha a logística de um namoro, como fazer para se encontrarem, e quando encontrar. Quem ia até ele ia por que queria, e pouco lhe consumia financeiramente.

Lembrou que na conversa tinha se deparado com as expectativas da moça, de passear, namorar, fuder gostoso até a última gota do seu semen, e já não era tão jovem para se atirar de cabeça, pegar uma carona e ir trepar num galinheiro, como fizera no passado quando foi para o interior com a namorada a uma festa de uma cidade lotada de gente, sem um lugar decente para ficar.

Pão duro assumido, pensava no quanto de dinheiro teria de investir para se deslocar até Santa Catarina para, quem sabe, até desfrutar de uma fracassada noite de amor. Tempo e dinheiro seriam de ser perdidos, racionalizou.

E se não estava fissurado por sexo, já que o que tinha lhe era suficiente, e nem tinha planos de construir casa e família como outrora, qual seria o foco dessa aventura?

Ciente de que o amor transtorna, e revolve o coração por dentro, obrigando o homem a fazer loucuras, como enlouquecer se ainda estava vivendo da loucura da sua natureza passada, buscando dar um tempo, vivendo em lucidez?

Foi quando naquela manhã de domingo, Bob Devasso ainda deitado na cama, resolveu abrir o aplicativo de mensagens, e teclar o texto que tudo expôs.

"Querida Luzinete,

Me diverti muito com a nossa conversa. Confesso que o teu tesão pela vida chegou a despertar minha libido, fazendo fluir aquela química que só acontece entre dois sexos, independente de gênero.

No passado fui um galinha obstinado por sexo e prestígio, muito mais do que por dinheiro.

E esse conflito entre o que fui, aquilo que vivi e conheço, e aquilo que posso vir a viver, e desconheço, me dá um medo danado.

Ou seja, perder o controle, sair do normal, enlouquecer para me envolver, era uma coisa que não estava nos meus planos, e que não pretendo trazer de novo para os meus dias.

Sei que tudo isso que escrevo na esperança de manter você na minha timeline como amiga, não é a tua realidade.

Você vive, busca, arrisca, paga pra ver e se mantém ativa tentando encontrar diversão e sucumbir ao desejo, pronta para se entregar ao destino, se enamorar, se envolver com alguém, se apaixonar para se sentir mulher em toda plenitude.

Sei que para você sou mais um outro cara sendo testado, observado para entrar no teu círculo de intimidade, ou ser deletado por insistir em querer ser algo diferente daquilo que você espera e quer.

Paciência, faz parte, mas já que cheguei até aqui, por que não enfrentar a realidade e pagar pra ver?

Os obstáculos não serão poucos, e só mesmo a força da construção de um sentimento de amizade, que vai além do desejo de querer gozar gostoso numa cama, para suportar."

Se despediu cheio de sensibilidade, da maneira mais social possível, sem demonstrar intimidade ou intenção, e apertou o send do aplicativo para enviar a mensagem.

Chegada a noite daquele dia, ao abrir a internet para ver as mensagens do aplicativo, tinha sido deletado, e o perfil da moça já não lhe dava acesso a nenhuma conversação.

Ligou a teve, acessou a Netflix, e foi assistir ao novo filme da grade, "O Aplicativo", onde entendeu melhor sobre esse tempo, em que a busca pela amizade transformou qualquer putaria num algorritmo que leva todos a se confrontar com o amor e a sexualidade.

 =======
#OAplicativo, #Netflix, #tiozinhodabarbabranca, #ByraDiOliveira, #amizade, #libido, #sexo  

Feliz Sem Idade - Neoguru Birya Sancho
Todos os direitos reservados 2017/21
Desenvolvido por Webnode
Crie seu site grátis! Este site foi criado com Webnode. Crie um grátis para você também! Comece agora