Viver Duas Vezes

Aníbal Machado tem um conto, "Viagem aos Seios de Duilia", em que um bem comportado funcionário público parte ao encontro da melhor lembrança da sua vida, Duilia, seu grande e inesquecível amor, que lhe mostrara os seios como prova de um inocente desejo, e para que guardasse a sua imagem ainda jovem, antes dele partir para a cidade grande.

E o que são as lembranças, para que preservá-las e manter vivo na memória, o desejo de querer revive-las depois de toda uma vida se passar?

Para muitos a vida só faz sentido mantendo o passado em aberto. Já outros sobrepõe ao tempo de antes novas estórias, tantas que o que ficou para trás perde sentido.

Deus nos dotou da graça da memória, um elemento do corpo humano que nos dá conhecimento e aprendizado, e que está ligado as emoções, aos sentimentos que queremos guardar.

Querer manter a mente funcionando, hoje em dia tem sido o foco de antropólogos e médicos para que todos desfrutemos de uma vida melhor e mais saudável.

Mas Deus se esqueceu de fabricar a perfeição, e deixou escapar a doença que põe um fim a todas nossas belas lembranças, e apaga nossas boas estórias, bem antes de a morte chegar, o Mal de Alzheimer.

E é sobre lembranças e o destino de quem sofre desse Mal que trata "Viver Duas Vezes", um filme espanhol dotado da sensibilidade de Maria Ripoli, que encontra no humor a melhor maneira de enfrentar as dores de um drama que não tem nada de engraçado, mas tem de ser enfrentado com espirituosidade e grandeza.

O trio pai/avó, filha/mãe, neta/filha nos mostra este enfrentamento por uma familia moderna, em meio aos sufucos de suas vidas, de uma doença que só tem a pedir uma coisa, carinho, repleto da compreensão e do respeito do convívio familiar.

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